Misto-Quente | Charles Bukowski

abril 13, 2018



Misto-Quente é uma das obras mais importantes de Charles Bukowski. Foi importante para ele durante o processo de escrita, e sem dúvida alguma é importante para nós, pois o livro trata de uma época de sua vida que até então era pouco conhecida, mas que sem dúvida foi determinante para o escritor e homem que Charles Bukowski veio a se tornar.

O livro percorre os períodos de infância, adolescência e juventude de Charles Bukowski. Começando com uma simples memória infantil, e indo até a tarde do bombardeio de Pearl Harbor. Dá primeira memória relatada ao bombardeio, seguem mais de 300 páginas e vários anos de uma vida complicada, dado a quebra da bolsa americana em 29, as espinhas durante a adolescência, seu pai autoritário e maluco e suas várias particularidades que o deixavam quase sempre alheio aos outros.

O protagonista do livro é Henry Chinaski, alter-ego do autor. Até por isso o livro não é oficialmente uma autobiografia. Seria mais um romance com toques autobiográficos, pelo menos é o que está escrito na quarta capa do livro.

Eu ouvi centenas de vezes que deveria ter começado minha leitura de Bukowski por Misto-Quente, e concordo com isso. É um ótimo livro para ambientação do leitor ao estilo de Bukowski de contar histórias e de escrever. Lendo Crônicas de um amor louco, o começo pode realmente ser um choque, entretanto em Misto-Quente você vai se ambientando e entendendo como o autor se formou enquanto escritor.

O livro é escrito de forma fantástica. É divertido, pois carrega uma simplicidade doce de infância, ao mesmo tempo em que é cru e duro ao nos mostrar a relação de Henry com seu pai. O livro tem um dos relatos mais profundos e honestos sobre a infância e adolescência, sem floreios, sem exageros, sendo sempre bastante real com os dilemas e raivas vividos pelo autor e que também são, de certa forma, típicos dessa fase.

A forma como a narrativa progride é brilhante. Quem deseja ser um escritor, precisa entender a forma como o livro flui e as passagens de tempo são orgânicas e naturais. É uma obra complexa, porque foi escrita muitos anos depois dos fatos narrados terem acontecido, então existe toda aquela dificuldade de retratar memórias antigas, e nesse sentido a escrita parece ignorar esse distanciamento, pois a leitura é tão calorosa que a impressão é de ter lido um texto escrito em tempo real.

Bukowski normalmente não é reconhecido como um grande escritor, tecnicamente falando, entretanto não vejo nenhuma crítica que possa ser feita a obra. Ela é extremamente pessoal e envolvente. É uma leitura agradável e o mais importante, é uma obra que nos aproxima muito do autor.

As pessoas que costumam dizer que Bukowski era só um velho bêbado e safado, realmente não entenderam absolutamente nada da obra do autor. Misto-Quente provavelmente esclareceria muito as coisas, e não falo como se os traumas de sua infância e adolescência o tornassem um velho coitado por quem devemos ter pena, pelo contrário, esses traumas e dificuldades o forjaram e o tornaram ainda mais resistente as pancadas da vida. Resistente como muitos de nós jamais seremos.

Misto-Quente é uma obra fantástica, de um autor fantástico.

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