Eu, Daniel Blake e a Segregação de gerações

maio 08, 2018


Diagnosticado com um grave problema de coração, Daniel Blake (Dave Johns), um viúvo de 59 anos, tem indicação médica para deixar de trabalhar. Mas quando tenta receber os benefícios do Estado, encontra-se emperrado numa burocracia injusta e constrangedora.

Com o avanço tecnológico, é notável a influência digital nas relações humanas nos mais diversos âmbitos. É notória também a contradição digital em larga escala, visto que ao mesmo tempo em que democratizou e facilitou informações, criou um abismo comunicacional entre o século XXI e os séculos anteriores.

Diante deste cenário moderno e digital, temos Daniel Blake, personagem principal do drama vencedor da ‘’Palma de Ouro 2016 (Cannes)’’ dirigido pelo britânico Ken Loach.

Imerso a situações com resoluções de caráter digital, Daniel tem enormes dificuldades para usufruir de seus legítimos direitos e o filme irá bater em demasia nessa tecla a todo o momento. Paralelo a isso, temos a história de Katie, mãe solteira de dois filhos recém-chegada na cidade, sem dinheiro buscando sobreviver e sustentar seus filhos, submetendo-se a situações desagradáveis, como a prostituição por exemplo. Até aqui tudo normal para indivíduos periféricos a margem da sociedade.

O mérito do filme se da pela cirúrgica crítica segregativa via comunicação, dado que desde os primórdios, de alguma maneira os tais ‘’donos do poder’’ mecanizam e manipulam situações para que permaneçam em suas respectivas posições.

Se na política somos representados por candidatos que vivem num mundo paralelo de linguagem própria, polidas, cultas, especialmente se num debate político, se na área administrativa existem termos e expressões próprias, as vezes até em outra língua, se em bairros de classes distintas existem comunicações antagônicas e que no fim, tudo colabora para um estado de inércia, o filme acusa a segregação moderna: era digital.

Adultos distantes do frenético avanço digital são ignorados e isolados de maneira bruta, salvo as exceções que conseguem se adaptar.
Não há demérito na não adaptação e o motivo é simples: não há incentivo.

O caminho é perigoso, afinal estão deixando de lado experiências e vivencias para criar, sem exagero nenhum, uma sociedade do zero que cresce de maneira precoce e afogam-se num mar de possibilidades.

Dentre as ótimas cenas do filme, há uma que representa bem todo esse papo, onde o personagem diz que consegue erguer uma casa, criar móveis, pintar, ajustar a parte elétrica, no entanto, ao não saber usar um e-mail, é visto como um indivíduo de outro mundo (e de fato é).

Daniel Blake é a representação de um cidadão que luta pelos seus direitos e não abaixa a cabeça para seus inimigos, mesmo impotente, sem saber o que fazer e quem esta enfrentando... Daniel Blake representa a resistência e a humanidade que nós temos (ou deveríamos ter).

Texto de: Gustavo Pauletto

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